momentosurdomudo
escuto o silêncio chegar. minhas mãos paralizam. prendo a respiração com medo de que ele vá embora, depois respiro novamente com bastante cuidado.
debaixo das cobertas, procuro fechar os olhos e ouvi-lo enquanto estala os vincos de madeira da casa (o silêncio também se espanta constrangido quando não é discreto). ele se alastra no ambiente abafando o som, mas mesmo o silêncio não é pleno em si.
de vez enquando a vizinha, não o percebendo, descreve trajetórias do seu quarto à cozinha e o silêncio se retrai, porque nem sempre é agradável ver seu oposto tão de perto. a sensação de ausência de si-mesmo pode ser terrível nesses momentos.
tem um ponto em que o silêncio descansa. o alívio do silêncio é seguido apenas pelo som agudo da terra girando. existe sempre de um determinado momento, até os milissegundos que antecedem nossa percepção.