quarta-feira, maio 03, 2006

seca quietude

descobri que fui sepultada. alguém me cobriu com terra ainda viva[ talvez durante o sono ], em colher pequena e azul.
sei da colher porque é fácil saberem que não suporto a agonia da ampulheta. sei que é azul porque é da minha natureza estar cercada de ironias.
por fim, sei que faço parte de um sepultamento por causa do silêncio excessivo, beirando um disfarce: até os pássaros parecem silenciosos e os carros furtam-se de histerias.
é um silêncio seco de angústia, como uma briga que não acontece, mas que se acumula no infinito.

transcendo. atravesso as paredes sem sumir, sem me esconder. se silêncio, aquieto grilos no afundamento do asfalto, interrompo gritos com punho cerrado, apareço verde na bunda dos vagalumes.
se barulho, eu mesma faço aos saltos de blocos de concreto no meio de museus e bibliotecas, hospitais e missas, cataclismas e velórios que não são os meus.
se sepulcro, pulo pesada no sonho de quem me enterrou e o enterro na banheira de um quarto de hotel. antes mesmo de ele comer as almôndegas.